Jovens estrangeiros ficaram seis horas sob poder dos criminosos.
Policiais dizem nunca terem visto 'algo parecido'.
Priscilla SouzaDo G1 Rio
O ataque a dois estudantes estrangeiros dentro de uma van no Rio e na Região Metropolitana, no sábado passado (30), chocou até mesmo policiais experientes e causou comoção em toda a equipe da Delegacia Especial de Apoio ao Turista (Deat), que acompanhou as vítimas, ouviu os depoimentos e prendeu os três suspeitos do crime, após investigação.
Os dois jovens vieram ao Rio participar de um intercâmbio. Eles moravam em um apartamento em Copacabana, na Zona Sul, e estudavam em uma faculdade também na Zona Sul. Na noite de sábado, o casal decidiu ir para a Lapa. Mas a noite que era para ser de diversão, se transformou em um pesadelo. Na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, na altura do Posto 5, eles embarcaram na van, conduzida pelos criminosos.
O casal viveu momentos de terror durante cerca de seis horas – tempo em que permaneceu sob a violência dos criminosos. O jovem francês, de 23 anos, foi algemado e espancado com a chave de roda do carro, enquanto, segundo investigadores, era obrigado pelos criminosos a ver a namorada americana, de 21 anos, ser agredida e estuprada repetidas vezes.
“Eles descrevem com riqueza de detalhes a violência sexual, principalmente. Impressiona bastante como eles descrevem o fato em si. A violência e a brutalidade. Nós mesmos, que somos da área de segurança e estamos acostumados a ouvir, nos surpreendemos. Não tem como qualquer pessoa não se colocar no lugar da vítima, seja do namorado assistindo ao fato ou dela que foi violentada. Ouvir o relato deles choca", contou o delegado assistente da Deat, Rodrigo Brant.
Violência no percurso
Os abusos aconteceram durante todo o trajeto. O veículo parava apenas tempo suficiente para que os suspeitos se revezassem no estupro à estudante e na direção da van. Do Rio, eles seguiram para Niterói, na Região Metropolitana, onde usaram o cartão da vítima para sacar dinheiro e para comprar bebidas e energéticos em um posto, que seriam usados no que o delegado Alexandre Braga chamou de "festa do mal". De acordo com o delegado, a intenção deles era "satisfazer" a luxúria". Imagens de câmeras de segurança do posto ajudaram na identificação dos suspeitos.
Depois, o trio seguiu para São Gonçalo, município de Região Metropolitana, onde dois dos três criminosos moram. "Lá, eles se sentiam à vontade, já que conheciam melhor a região", explicou o titular da Deat.
A estudante voltou para a van, que seguiu novamente para São Gonçalo. Apenas por volta de 6h, o trio libertou o casal em Itaboraí, município vizinho a São Gonçalo, na Região Metropolitana. Os jovens pediram carona em uma van para voltar ao Rio e, depois, pegaram um táxi para ir para casa. "Eles não procuraram a polícia imediatamente, foram para casa primeiro. Nessa hora, tudo que a mulher vítima de violência sexual quer é tomar banho", disse uma policial.De acordo com a polícia, quando o cartão do rapaz estourou o limite, o trio ameaçou matar o jovem. Nesse momento, a namorada disse que tinha outros cartões em casa, fazendo com que os criminosos retornassem à Copacabana, na Zona Sul do Rio. A jovem subiu no apartamento para pegar os cartões, enquanto o namorado era mantido refém na van. "Ela nem pensou em pedir ajuda porque estava em choque e temia pela vida do namorado", contou o delegado.
Um dia inteiro na delegacia
Acompanhado de representantes do consulado, o casal chegou à delegacia pouco antes das 10h. De lá, só saríam depois das 23h. Segundo policiais, o rapaz chora bastante, enquanto a namorada, em estado de choque, não esboçava reações, parecia "fora da realidade".
A estudante foi levada por uma policial ao Hospital Miguel Couto, na Gávea, também na Zona Sul, onde recebeu medicamentos para evitar gravidez e doenças sexualmente transmissíveis, como o HIV. De acordo com relatos de investigadores, o caso também sensibilizou médicos responsáveis pelo exame de corpo de delito.
O casal reconheceu os dois primeiros suspeitos a serem presos. Jonathan, que confessou o estupro, ainda usava a mesma roupa da noite do crime: uma camisa do Internacional.
O estudante conversou com os pais pelo telefone, já a namorada não teve condições emocionais de falar com os pais. Segundo os policiais, ela pediu apenas para falar com o irmão mais velho, que ficou responsável por dar as más notícias à família. Mesmo em meio ao sofrimento, os jovens não deixavam de demonstrar carinho um pelo outro.
"Eles demonstravam um carinho tão grande. Agora, você imagina uma estudante passar um terror desse por 6 horas. E ela é tão frágil, tem 21 anos mas aparentava ter 14. No sábado, ninguém comeu nessa delegacia, quem estava de folga veio trabalhar, até o delegado assistente que ia tirar férias veio", contou uma policial, que mesmo experiente, não deixa de se emocionar: "As pessoas, às vezes, acham que policial não é ser humano, mas nós sentimos. Eu nunca vi nada parecido", disse.
A ausência de arrependimento por parte dos suspeitos também chamou a atenção do titular da Deat, Alexandre Braga, que considerou o fato incomum. "É um ponto fora da curva, algo que não costuma acontecer no Rio de Janeiro. Foi algo abominável, mas não é rotineiro. É importante que se saliente isso", frisou o delegado.
Fonte: http://g1.globo.com